quinta-feira, 23 de setembro de 2010

O jeito do Mineiro...


Somos do tipo que se esconde atrás de montanhas para não ter que falar muito, não porque não gostamos de falar, mas porque é cansativo demais ser ouvido. Todo mineiro entende que "uais" não são simples "uais", que "sô" não é "senhor" e "trem" não tem rodas, mas quem além de nós sabe disso? 
Falar demais é arriscar ser desentendido; não arriscamos quando não temos certeza, e certeza, a gente bem sabe, é artigo raro que não está à venda nos mercadinhos de esquina. Em Minas, a certeza é a antítese do queijo. 
Nossa desconfiança nata nos torna reclusos, e é essa reclusão que nos transforma em mineiros.
Somos criados enclausurados entre serras, vendo sóis nascerem e luas brilharem. Hoje ouvimos o mugido do gado ser transformado no rugir de motores, e é assim que assistimos ao despertar de um tempo novo, avesso a todas as coisas que conhecemos, tempo esse em que 140 caracteres dizem mais que mil palavras. 

Nós estamos perdidos, decididamente perdidos. A mineiridade não sobreviverá a esse século, ele pertence às cidades cheias e aos campos vazios de gente. Ao pó, ao barulho, às luzes, ao concreto que deixa de ser adjetivo para se tornar substantivo e construir passarelas e ruas que ligam lugares a lugares, mas não as pessoas.
Não há mais conversinhas nas praças, mal conhecemos quem vende os remédios que precisamos tomar para nos sentirmos saudáveis, o cafezinho dos bares tem gosto de tudo, exceto de café, e a razão de bebê-lo se confunde com necessidade. 

Mineiro algum nunca passou à tardinha no Café Pérola, ou em qualquer outro, por necessidade, sempre foi por, sei lá, senso de religiosidade... ou de justiça. Entende-se, em Minas, que o bate-papo à beira da calçada e a atualização diária sobre a vida alheia é um dos meios de se fazer justiça na Terra. 
Não dar a um assunto, por menor que seja ele, a relevância que merece é um crime; a fofoca é a cura.
Mas, com o passar do tempo, ser mineiro se tornou muito mais não sê-lo: ninguém da nova geração reconhece a santidade do pão-de-queijo, nem leva as quitandas da avó para a escola. (Blasfêmia!) A mineiridade, já disse, está ruindo, e em seu lugar nasce uma segunda maneira de lidar com a vida, a que talvez possamos chamar de "sobriedade". Ser sóbrio é reconhecer-se incompleto, inconstante, inacabado. 

Talvez seja um modo mais acertado e menos pretensioso de viver, mas, cá entre nós, a única pretensão que sempre tivemos foi a de não falar demais. 
Eu mesmo me alonguei além da conta tentando explicar o que é que a gente é. Pois somos quem vive nas montanhas, quem tem vida interior e se torna gente enquanto tenta ser parte da nossa gente.
É melhor partir agora, sem dar mais detalhes do que faço ou vou fazer. Essas coisas a gente aprende com o tempo.

*Extraído do excelente blog Tô Frito: http://tofrito.terra.com.br

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